sábado, 14 de junho de 2008

Olhares de Bar

Não era um dia bom. E dias que não são bons, quase nunca tem final feliz. Mas não podia dizer também, que era um dia ruim. Era um dia daqueles que parece que você não está lá. Lá onde? Lá em todo o lugar, alguma coisa que puxa as pessoas de um lugar para o outro e de outro para outro, não deixando-nos parados em lugar algum e no final estamos em lugar nenhum.

Era desta maneira que ele estava se sentindo naquela tarde, na verdade aquilo havia começado de manhã e ia acompanhá-lo até tarde da noite: um sentimento saudoso no ar. Mas e teria razão sentir saudade de alguém qual mal conhecia? E quem irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração? Bem cantou Renato Russo, pois naquele dia nada parecia ter razão, e isso não permitia que ele se concentrasse em suas nenhum de seus afazeres.

Como a internet em dias de mau tempo, ele não estabelecia conexão com nada: nem com o despertador que tocou e foi desligado, nem com a mãe que ligava desde cedo da manhã, nem com o chefe que cobrava as tarefas atrasadas, nem com a prova na faculdade e muito menos com a vizinha do 615 que muito insinuante, o auxiliou com nó na gravata no elevador do prédio.

Assim, naquela tarde, nada parecia ter importância, logo, desejou praticamente o dia todo voltar o tempo na noite anterior para sentir novamente, mesmo que de relance, aquele perfume, também obter de alguma forma o telefone daquela inesquecível fragrância e principalmente se inebriar com o brilho daquele olhar. Nada fazia esquecer o semblante da menina de cabelos negros e riso fácil que monopolizou por longas horas sua atenção.

Ao avistá-la concordou que aqueles olhos não eram para ele estranhos, e até tentou por alguns momentos recordar algum lugar ou ocasião que os encontrara, mas foi em vão e também não interessava, o que importou foi o tempo os quais seus olhos se deleitaram com magnetismo de sua íris.

Sempre fora adepto de uma vida cujo lema era o Carpe Diem, onde o aproveite o dia nunca poderia ser esquecido. Para tanto não considerava barzinhos como lugar correto para encontrar a pessoa certa, um alguém especial com um brilho especial. Era ele mesmo que distribuía conselhos e alertas sobre as garotas de balada aos companheiros de conduta, com discurso categórico: “garotas de bar são excelentes mulheres, possuem olhares penetrantes e embriagadores; mas não são estes os olhos que servirão para repousar sobre o berço de seus filhos e muito menos os que servirão de cobertor para sua pele!” Talvez esse julgamento era o que estava o condenando e fazia daquela sensação uma sensação sufocante, pois embora tenham trocado somente olhares esguios, tímidos e desconfiados, aquele olhar penetrante e ao mesmo tempo doce era um olhar de bar, e mesmo assim lhe tão profundamente de maneira que não o pôde esquecer.

Sentiu por muitas vezes ao longo dia, vontade de sentar ao lado de alguém e conversar sobre aquele olhar e o que o seu estava a divagar, mas corria em suas veias um medo enorme de que alguém interpretasse aquele como um olhar sentimental e que nele transparecesse um sentimento que não poderia ser visto: a paixão. O fato era que já havia passado várias horas e aquele frio que sentiu quando ela passou por detrás de sua cadeira no bar, deixando um suave frescor de ousadia, graça e segurança ainda não havia o deixado.

O pior não era ter que enfrentar o que estava acontecendo, mas o pior era, saber que não sabia muita coisa daqueles olhos cor de mel e não também não tinha idéia de quando poderia os vê-los novamente.

Batendo a caneta na mesa do escritório, indagou-se sobre a sua filosofia do Carpe Diem. Será que soube aproveitar as oportunidades que o dia lhe deu? Certamente não, porque ficara enfeitiçado de tal modo que não conseguiu agir, só observar. Frustrou-se. As dúvidas eram muitas. Fora acometido de um sentimento de insegurança e de medo de não poder encontrá-la novamente. Será que percebera que aquele riso fácil e aqueles olhos tímidos e penetrantes poderiam preencher parte do vazio de seu futuro? Ou será que aquele era um olhar de bar, só de uma noite, só pra se encantar?

Em meio a tantos pensamentos, mal imaginava ele que, ela também percebera seu olhar e estava acometida dos mesmos sintomas psicológicos. Conhecia a sua filosofia de olhares de garotas de bar, entretanto desejava os ver novamente.

E ali, existia olhares que se completaram em uma noite e faziam falta em uma tarde de um dia que não era bom, mas que precisava de um final feliz. Às vezes um olhar correspondido pode encantar e fazer um dia ficar feliz, mas também um olhar contido pode calar, fazer sofrer e fazer um dia ficar infeliz. E quem impedirá uma história como essa, de olhares perdidos em um dia não tão bom de ter um final feliz? Somente eles mesmos, os próprios, se não souberem dar uma oportunidade para esses olhares sejam eles tímidos, penetrantes, esguios, puros, desconcertantes ou de bares, completarem e agirem por si só. Bastará olhar.

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