quinta-feira, 13 de março de 2008



Acinzentou...

Início de ano e volta às aulas é sempre aquela coisa: as crianças empolgadas para a compra e o uso dos materiais escolares novos. É um tal de eu quero essa mochila porque é grande e mãe que quer aquela que é mais forte. É filho querendo borracha perfumada e mãe querendo-a na ponta do lápis.

De fato, comprar os materiais para a criança é fantástico, envolve uma emoção e a preparação para o novo que está por vir e, acredito que nada mais empolgue tanto-as quanto à caixa de lápis de cor. Os olhos parecem emitir uma luz de um brilho tão forte que é capaz até de convencer as mães em trocar a caixa de 12 cores por aquela de 48 com cores metálicas.

Indiscutivelmente, as cores provocam um fascínio indescritível não só em crianças, mas em jovens, velhos e adultos. O impacto causado pelas cores é capaz de compor sentimentos, reviver histórias e até traz a lembrança de cheiros e sabores. Quando pequenos, temos a adoração pelas cores “sexuais”, qualquer coisa: laço, boneca, roupa, ursinho, pirulito, até a cor do olho se possível tem que ser rosa bebê para as meninas e tudo para todos os garotos deve ser azul (exceto os colorados).

Os pequenos vão crescendo e o rosa torna-se apagado e brega e perde espaço para o pink e o roxo que são mais alegres e chamativos e o azul é substituído pelo preto, amarelo e o vermelho que transmitem força e energia. Na adolescência, a às vezes chamada época da rebeldia dá início à fase “dark” dos anjinhos.

Engraçado não é?! Falando assim o que nos parece é que em cada fase da vida somos acompanhados por uma cor característica. É fácil perceber, quando estamos em paz de espírito e de pensamento, vivemos a fase do “tudo azul”, sonhar e construir um ideal é o que nos transparece, vários momentos de nossas vidas são assim, onde podemos sentir o ar circulando dentro dos nossos pulmões e percebemos a vida em sua plenitude de pureza.

Entretanto, essa paz é abalada pelo desafio, pela inovação e o que era azul fica vermelho de raiva, de ânsia de conquistas. A monotonia de antes é substituída por idéias de revolução, nestes momentos da vida queremos mesmo é: inovar, arriscar, entregar, apaixonar. Essas fases carnais sempre vem precedidas de uma enxurrada de sentimentos: amor, paixão, raiva, rancor, arrependimento e, conforme a natureza e a grandeza deste sentimento uma nova cor pode pintar as nossas vidas. Ela pode ser negra, trazer a morte de sonhos, medos, ideais. Fases negras costumam-nos marcam eternamente, passeia de ares sofisticados e luxuosos a becos escuros e intermináveis: podem trazer tempestades e relâmpagos que inauguram a fase cinzenta.

Não só o negro precede o cinza, há momentos que pode ser o vermelho, o rosa, o branco. Mas é no cinza que acontece a melhor de todas as fases: o auto-conhecimento. As cores são luzes que nos provocam emoções e sensações e como tudo no mundo ou emite ou irradia uma luz, somos diretamente afetados e incentivados por ela. Em momentos de grande euforia arriscamos de vermelho, nos acalmamos com a tranqüilidade branca, descansamos sob a mata verde. Vivemos uma paixão cor-de-rosa, nos agitamos no fervor do laranja e meditamos com velas roxas, mas só nos entendemos no cinza.

Alguns já citaram que o cinza é a cor da melancolia, da tristeza; ainda acrescentaram que dá medo e causa depressão. Mas, há quem diga que desencadeia processos de estabilidade, promove o sucesso e a qualidade. Leva-nos ao caminho do desconhecido onde ao final estaremos mais conscientes de nossos atos e emoções. O calor dos tons quentes inebria-nos e nos perturba a alma: paixões, erros, provocações; e o gelo das cores frias congela nosso coração: desilusões, angústia, mas, para o bem do nosso arco-íris, tudo deve acontecer.

Comprar o material novo só para pintar um arco-íris com os mais belos tons da caixa de lápis de cor é enriquecedor; pois só com todas as cores ele ficará mais bonito. E para que ele apareça pleno é preciso que antes aconteça a tempestade com seus raios e perturbações, onde, só assim teremos a certeza de que o céu ficará de novo azul e amarelo do sol vai brilhar e nos aquecer.
Publicada no Jornal Liberal de 14/03/08

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