quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Mudança da Lua


“A lua era feliz. Imponente, brilhava no céu todas as noites. Em companhia das estrelas, abraçava os enamorados e os pensadores com seu esplendoroso brilho. A lua via, todos os dias, o sol nascer e anoitecer. Via de canto de olho a alegria de todos com a sua chegada: girassóis, crianças, flores e o mar. E de repente, a lua ficou triste, triste porque a lua queria ser o sol. Queria ser ela, quem esquentava os caminhantes pelas manhãs; queria ser ela que desabrochava as flores e desejaria ela acompanhar o movimento e os sons do dia e não o silêncio e a solidão da noite. E um dia a lua foi se aconselhar com o mar. O mar que por ora apresentava faces calmas, ora bravias e indomáveis, o velho e sábio mar. Para ele contou suas angústias, aflições e desejos. Ele, porém, refletiu sereno em suas águas o brilho da noite e lembrou à lua, todos os momentos maravilhosos que ela já viveu por ser ela mesma, sem desejar ser sol. Era só ela que tinha a companhia das estrelas, só ela ouvia as serenatas apaixonadas para as românticas donzelas e somente ela desfrutava das filosofias dos pensadores. Percebeu, que o sol era solitário, que não gostava do som das buzinas dos carros e nem da fumaça das fábricas, mas mesmo assim, o sol era feliz. E vendo as angústias e alegrias do sol, a lua entendeu o seu papel e viu que era feliz. Assim, diante da sapiência do mar, a lua desistiu de virar sol e passou a brilhar ainda mais plena e charmosa no céu, porque percebeu que não precisava ser sol para ser feliz, mas para isso, só precisava ser dela, com defeitos, mas sem máscaras e medos. Só precisava ser ela: a LUA”.

Engraçado que, conforme o balanço das ondas do mar e do mesmo modo pelo qual a lua quis virar sol, nós também por hora desejamos mudar. Torna-se difícil compreender, mas fácil perceber que ares marítimos atingem e mudam nossas vidas, onde alguns destes ventos sejam da vida profissional, pessoal ou sentimental nos atingem tão vertiginosamente que nos fazem perder a direção, nos levando a lugares obscuros dentro de nossas próprias mentes.

Ora calmo, ora tempestuoso, a forma com que o mar se apresenta mexe com nossos brios e pensamentos e nos deixam vulneráveis e sem rumo diante das tempestades e da calmaria. Situações assim afetam nosso modo de pensar, de agir e de ser, no entanto: navegar é preciso! Seja com os raios de sol ou com o brilho da lua. Seja por mares conhecidos, seja por mares nunca antes navegados.

Como desbravadores, ás vezes navegamos por águas que nos confundem e atormentam de tal forma que nos fazem perder o leme do barco, a direção da vida e nos fazem até esquecer de quem realmente somos. Sim, somos fortes e não podemos pestanejar diante dos desafios, mas muitas vezes na ânsia de querermos nos mostrar astutos e capazes, acabamos sendo quem não somos. Nestes momentos, nos lembramos dos grandes navegadores que desbravaram todos os mares do mundo e assim criamos um espelho diante deles que nos cegam e não nos fazem perceber nossas qualidades, particularidades, anseios, defeitos e medos. Não nos deixam ver que somos frágeis e imperfeitos e que se não nos aventurarmos como somos, não chegaremos a porto algum.

Assim é quando nos apaixonamos, seja por pessoas, por coisas e por lugares. Em um primeiro contato, tudo aquilo que nos parece novo, traz, tanto para nós, como para as pessoas, coisas e lugares que conhecemos, uma grande euforia e uma imensa satisfação de ter finalmente encontrado algo que nos faça bem. Entretanto, vemos todos estes sentimentos se perderem ao sabor do vento diante da uma gigantesca expectativa de ser o melhor, para as coisas, para os lugares e para as pessoas e esta banal e vã expectativa, muda atitudes, comportamentos e escondem a autenticidade e a verdade de cada um, aí esquecemos o quanto é bom ser lua e queremos virar sol.

Esquecemos também, o que cantou Humberto Gessinger que “você se apaixonou pelos meus erros”, e que assim como nos encantamos pelas coisas, lugares e pessoas, elas também se encantaram por nós do jeito que somos: cheios de manias, idiotices e rabugices. O que resta é não querermos parecer com o sol ou com a lua, nem querer demonstrar grande sabedoria sobre os segredos indesvendáveis do mar, basta somente, sermos, porque do jeito que somos, ”somos o que há de melhor e somos o que dá pra fazer”, sem precisar evitar, nem esconder.

Disse uma vez, sabiamente, Sigmund Freud: “Nós poderíamos ser muito melhores se não quiséssemos ser tão bons”. Cada um de nós possui a sua própria essência, cada qual tem a sua maneira de ver e de enfrentar a vida e tão logo, de forma alguma precisamos ser como foram os famosos piratas e capitães que cruzaram os sete mares, pois cada um venceu pelo que era, sem precisar refletir no espelho de sua jornada a imagem de ninguém, mas que, jamais deixaram de ser bravos e mesmo diante do balançar das águas do mar, pois souberam administrar suas fraquezas, mostrar pureza em suas relações e a simplicidade no aceitar as mudanças que lhe ocorreram.

“Não é o mais forte quem sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”, Darwin compreendeu que é importante aceitar e encarar as mudanças, todavia é necessário também compreender que muitas coisas não irão mudar, sejam estas coisas, os fatos ou as pessoas. Somos o que somos não por si só, mas pela existência de uma relação do eu com o você, com o nós, com o eles, onde tudo envolve emoções, sensações, percepções e traz muitas dessas mudanças, pois somos diariamente influenciados e influenciamos tudo o que nos rodeia.

Logo, por hora, apesar o mar bravio é preciso navegar e acreditar que muitas vezes, não precisa mudar, não precisa deixar de ser lua, pois tudo vai se adaptar ao seu jeito: se for real, se for verdadeiro. Mudanças vêm e acontecem, nos aperfeiçoam e nos colocam nos nossos devidos lugares, junto com as coisas que nos fazem feliz e perto das pessoas que nos fazem bem. E no final fica tudo bem: seja na cama pequena, seja em dia de sol, ou em noite de lua, seja no porto seguro; pois se tem o dom de iludir, cada um reconhece e sabe a dor e alegria de ser o que é e, principalmente ser feliz.

Um comentário:

Athena disse...

coincidências sinistras estilo Amelie são mais frequentes que o imaginado.
mais um ótimo relato da vida desfarçado aiuhaiuhaiuha
um super beijos Polly
espero pela próxima coluna
=************
mar = água = .....