quinta-feira, 3 de abril de 2008

Quem tem algo a dizer?


“Maria Clara sentou-se no banco da praça em mais uma tarde de sol e por mais uma vez chamou a atenção de Charles. Ele sempre a observava de longe, mas não se aproximava. Notava que cada semana ela chegava com um autor diferente: Drumonnd, Lispector, Neruda, Camões. Ela também notara que estava sendo observada e gostava, um dia os olhos se encantaram e Charles veio falar com ela. A conversa rendeu... Cinco minutos e um silêncio constrangedor! Ela levantou-se decepcionada e foi embora. Após a apresentação trivial, o diálogo passou para uma análise de gostos: ela amava romances e questões sobre origem da vida e do pensamento e ele se amarrava em “azarar” as gatinhas e fazia coleção de latinhas de cerveja. Ela era fã de Machado de Assis, ele não sabia quem ele era. Ela tinha 15 anos e ele 21”.
Houve um tempo em que achei a literatura portuguesa chata e ler seus livros para mim, era um sacrifício, me causava pânico, me dava tédio, enfim: achava um verdadeiro saco. Não que não gostasse de ler, como até já lhes confessei uma vez, os gibis foram meus primeiros e melhores amigos além de companheiros inseparáveis de tardes e manhãs aguardando a hora de ir para o colégio; mas o que acontece é que no meu tempo de criança curiosa e sonhadora, o contexto histórico e o enredo detalhista dos romances brasileiros não faziam meu perfil. Graças a Deus e ao desespero de um futuro vestibular, peguei gosto pela coisa e hoje sinto falta e até releio algumas obras que me marcaram daquele tempo.
O fato é que mesmo diante do acúmulo de conhecimento adquirido com milhares de risadas trazidas a mim por Mônica e sua turma e dos ataques de nervos causados pelo descobrimento de um emplastro, a cada novo comentário sobre um velho livro ou sobre um escritor do passado o qual eu não conheça me martela o peito, me indignando: - O que você está fazendo que ainda não leu isso? - Uma sensação de tempo perdido me aflige tão vertiginosamente que a indignação chega antes de uma resposta pronta que a justifique.
Não que eu queria aqui dar sermão à falta de interesse de uma forma geral do povo brasileiro pela leitura e da importância que este ato tem na vida principalmente das crianças e jovens, mas o que se conclui é que quem não lê não tem nada a escrever e muito menos a dizer.
Aí, os senhores podem apontar-me a internet e as demais tecnologias do século XXI como as causadoras do problema, pois eu fico muito satisfeita em falar-vos que isso é uma tremenda muleta! Talvez eu deva mesmo dar graças a Deus por não ter tido acesso a todas essas modernidades no meu tempo de ensino fundamental e médio, o que permitiu o estreitamento dos meus fraternos laços com a leitura e o conhecimento, mas uma ressalva deve ser feita: nem tudo o que está na internet é inútil e há vida inteligente oferecendo um conhecimento de garbo e qualidade na rede, em meio a site de relacionamentos, blog´s e principalmente fora da mídia principal: é só saber procurar e o que analisar, porque dá pra ler e adquirir conhecimento na net!

Erga a bunda da cadeira neste momento e rasgue a página desta coluna, aquele pai ou mãe ou irmã ou chefe, que não castigou seu filho ou irmão ou funcionário, cortando-lhe o acesso aos www’s e seu alto poder entretenimento e de concentração de atenção! Todos sentados e página inteira, não é mesmo? Internet é preferência mundial, sem dúvida nenhuma e não deve ser culpada pela falta de assunto e falta de leitura de qualquer pessoa.
Alguns definem a tarefa de ler um texto, um livro, uma coluna, uma crítica ou até mesmo uma pequena charge no jornal como irritante e aborrecedora, mas eu lhes digo que irritante e aborrecedora é a futura geração que não terá nada a acrescentar aos seus descendentes, e isso não se trata de uma informação extremista e radical, mas real.
Estudar é chato, ler é perder tempo, falar de política e economia é para nerd´s, história e filosofia são para loucos, genética e ecologia é coisa para cientistas e hippies e literatura é um assunto brega e ultrapassado! Pois bem, talvez há quem considere essas premissas como verdadeiras, mas eu lhes pergunto qual será o futuro de pessoas com este pensamento?
Parecer atraente para conquistar um belo rostinho, adquirir uma eloqüência para uma entrevista comercial, mostrar-se hercúleo diante de um problema a fim de resolvê-lo, obter uma quantidade razoável de conhecimento para enfrentar um vestibular, formar uma opinião com vastos argumentos diante de um determinado assunto: conhecimento! E todo este, possibilitado a nós sob a forma de livros, artigos, contos, notícias e colunas impressas ou on line, para que possamos devorá-los e nos tornar-nos insaciáveis pelo saber. Deu sono? Preguiça? A opção é de cada um. E além do mais. Quem disse que saber era tarefa fácil? Entretanto, acredito que vale pagar o preço, pois além de ser muito entreter, é profícuo e indispensável para quem tem objetivos e tem algo a dizer. Não é mesmo, Charles?

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